terça-feira, 6 de outubro de 2020

Minutos de leitura - Hespérides

Depois de ter velejado durante muitos dias e muitas noites, compreendi que o Ocidente não tem fim, antes continua a deslocar-se connosco, e que podemos segui-lo enquanto quisermos sem nunca o alcançar. Assim é o mar ignoto que fica para além das Colunas, sem fim e sempre igual, do qual emergem, como pequena espinha dorsal de um colosso desaparecido, pequenas cristas de ilhas, nós de rocha perdidos no azul. 

A primeira ilha que se encontra, vista do mar, é uma extensão de verde e no meio dela brilham frutos como gemas e, por vezes, aves estranhas de plumas purpúreas confundem-se com eles. As costas são impérvias, de rocha negra habitada por falcões marinhos que choram quando cai o crepúsculo e que esvoaçam inquietos com ar de sinistra pena. As chuvas são abundantes e o sol impiedoso; e devido a este clima e à terra preta e rica as árvores são altíssimas, os bosques luxuriantes e as flores abundam: grandes flores azuis e cor-de-rosa, carnudas como frutos, que nunca vio em nenhum outro lugar. as outras ilhas são mais rochosas, mas também ricas de flores e frutos; e os habitantes tiram grande parte do seu sustento dos bosques, e o resto do mar, que tem águas tépidas e ricas em peixe."

"Hespérides", in Mulher de Porto Pim / Antonio Tabucchi. Alfragide. D. Quixote, 2006 

! - A s Hespérides eram divindades da mitologia grega que estavam relacionadas com a Natureza.

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