"Passaram dias e dias. O rapaz voltou muitas vezes às rochas, mas nunca mais viu a menina nem os seus três amigos. Era como se tudo tivesse sido um sonho.
Até que chegou o Inverno. O tempo estava frio, o mar cinzento e chovia quase todos os dias. E numa manhã de nevoeiro o rapaz sentou-se na praia a pensar na Menina do Mar.
E enquanto assim estava viu uma gaivota que vinha do mar alto com uma coisa no bico. Era uma coisa brilhante que reflectia a luz e o rapaz pensou que deveria ser um peixe. Mas a gaivota chegou junto dele, deu uma volta no ar e deixou cair a coisa na areia.
O rapaz apanhou-a e viu que era um frasco cheio duma água muito clara e luminosa.
– Bom dia, bom dia – disse a gaivota.
– Bom dia, bom dia – respondeu o rapaz. – Donde é que vens e porque é que me dás este frasco?
– Venho da parte da Menina do Mar – disse a gaivota. – Ela manda-te dizer que já sabe o que é a saudade. E pediu-me para te perguntar se queres ir ter com ela ao fundo do mar.
– Quero, quero – disse o rapaz. – Mas como é que eu hei-de ir ao fundo do mar sem me afogar?
– O frasco que te dei tem dentro suco de anémonas e suco de plantas mágicas. Se beberes agora este filtro passarás a ser como a Menina do Mar. Poderás viver dentro de água como os peixes e fora da água como os homens.
– Vou beber já – disse o rapaz.
E bebeu o filtro.
Então viu tudo à sua roda tornar-se mais vivo e mais brilhante.
Sentiu-se alegre, feliz, contente como um peixe. Era como se alguma coisa nos seus movimentos tivesse ficado mais livre, mais forte, mais fresca e mais leve.
– Ali no mar – disse a gaivota – está um golfinho à tua espera para te ensinar o caminho.
O rapaz olhou e viu um grande golfinho preto e brilhante dando saltos atrás da arrebentação das ondas. Então disse:
– Adeus, adeus, gaivota. Obrigado, obrigado.
E correu paras as ondas e nadou até ao golfinho.
– Agarra-te à minha cauda – disse o golfinho.
E foram os dois pelo mar fora.
Nadaram muitos dias e muitas noites através de calmarias e tempestades."
A Menina do Mar / Sophia de Mello Breyner Andresen ; il. Fernanda Fragateiro. Porto : Porto Editora, 2012. Imagem: Copyright – Fernanda Fragateiro
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