O deus do Remorso e da Nostalgia é um menino com cara de velho. O seu templo ergue-se na ilha mais distante, num vale defendido por montes inacessíveis, perto de um lago, numa zona desolada e selvagem. O vale está sempre coberto por uma bruma leve como um véu, há altas faias que o vento faz murmurar e é um lugar de grande melancolia. Para chegar a este templo é preciso percorrer um atalho cavado na rocha que se assemelha ao leito de uma torrente desaparecida; e, pelo caminho, encontram-se estranhos esqueletos de animais enormes e ignotos, talvez peixes, ou talvez pássaros e conchas; e pedras rosadas como a madrepérola. (...)
E assim cheguei mesmo ao cimo do promontório, e enquanto observava o mar infinito, abandonando-me já ao desalento que a desilusão provoca, uma nuvem azul desceu sobre mim e arrebatou-me para um sonho; e sonhei que te escrevia esta carta, e que eu não era o grego que partiu em busca do Ocidente e não mais voltou, mas que estava apenas a sonhá-lo.
Hespérides", in Mulher de Porto Pim / Antonio Tabucchi. Alfragide. D. Quixote, 2006
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