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terça-feira, 15 de março de 2022

Leituras...

 Leituras na Biblioteca:

Que valor podemos dar ao tempo com que pretendemos concretizar os nossos desejos, aquilo que queremos ter? Esperando por algo que desejamos, essa conquista revela-se melhor, mais interessante? A espera tira ou dá significado ao que obtemos, ou pretendemos ter?
A partir da leitura de "Os figos são para quem passa" e de "Espera, Miyuki" abordaram-se estas ideias. Um urso que queria comer um figo maduro, que considerava sua propriedade e de mais ninguém e de uma menina que ao querer acordar a Primavera no seu primeiro dia procurou a água mais cristalina, perdendo esse momento.
O que existe na Natureza é algo a desfrutar por todos?
Esperar ou contemplar? Alguns dos trabalhos realizados, assim como as narrativas imaginadas pelos alunos serão a seu tempo divulgadas.

 


segunda-feira, 14 de março de 2022

Leituras - Os figos são para quem passa

 Os figos são para quem passa - Álbuns ilustrados, Livros - Loja online do  Planeta TangerinaNo tempo em que todos caminhavam sem levar nada consigo, um urso detém-se junto a uma figueira decidido a comer o seu fruto preferido.
O urso observa os ramos. Porém, entre a folhagem,
encontra apenas um figo ainda um pouco verde:
"Quanto tempo levará este figo a ficar doce?
Talvez um dia?"
E, muito confiante, senta-se à espera.
 
Mas, junto à figueira, aguardam-no muitas peripécias.
Porque... para quem serão os figos afinal?
Para quem passa? Para quem os guarda?
Para s mais fortes? Para os mais rápidos?
Ou para quem tem mais fome?

Os figos são para quem passa / João Gomes de Abreu; il. Bernardo P. Carvalho. Carcavelos: Planeta Tangerina, 2016.
 
(leitura e reconto de, Os figos são para quem passa. Mais tarde publicaremos esses textos).

quinta-feira, 3 de março de 2022

O livro do mês

 "Toda a água me passa entre as palmas abertas, e de 
              repente não sei se as águas nascem de mim, ou para mim fluem.
Continuo a puxar, não já memória apenas, mas o 
              próprio corpo do rio." (José Saramago)

Inês Fonseca Santos escreveu um livro sobre o autor de Memorial de Convento, especialmente pensado para os mais novos. "Homem-Rio" é assim uma biografia sobre José Saramago que pretende dar a conhecer a geografia do autor, naquilo que foram os fundamentos da sua vida em criança / adolescente e de como essa memória forjou os sinais da escrita que anos mais tarde haveriam de nascer.

Pegando nos significados associados a um rio, como nascente, margens, fluir, a autora fez uma associação com a escrita e sobretudo com a vida de José Saramago. O rio com os seus abraços sobre as margens inspirou a autora a desenhar esses diversos lados que foi a escrita de José Saramago e o contexto da sua própria vida. Se um rio pode ter muitos afluentes, um escritor pode ter muitas margens, todas aquelas que ele inventa e vive.

Assim, dos muitos Saramagos que existiram no corpo de escritor, a autora foi buscar o mais pequeno, "o miúdo Zé", o seu lugar e as suas características humanas e sociais. Assim, entre o vivido e o imaginado foi acrescentada a memória, como forma de recuperar uma experiência e um tempo. Habitando a cidade, essa memória foi a substância que formou em casa dos avós, nas planas águas do Ribatejo. 

"Homem-rio" apresenta-se como uma bonita ilustração a lembrar-nos uma novela gráfica e os seus desenhos juntam a memória de uma experiência com o futurismo das descobertas, com a distância a que muitas vezes deixamos os outros. As palavras em vez de naves espaciais, a linguagem em vez das coisas vistas e não compreendidas, não observadas. A palavra, como forma de exprimir uma ideia, uma vontade, um desenho, uma aspiração a lago mais sublime. 

Dessa palavra estão registadas formas de olhar as coisas, como uma casa onde se habita. A casa que como o rio corre livre e pode ser o lugar onde nos identificamos e que nos acolhe. A casa como expressão da liberdade, essa onde nasceram muitos outros escritores e que aguardam pela nossa voz, no  interior das suas palavras. Existem sonhos que apenas esperam tempo para nascerem, esses que juntam o real, o imaginado e a memória sempre à disposição do que formos capazes de criar.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

O livro do mês


 “(…) Expliquei à professora que na sala de aula tudo era perto e que nada se distanciava de nada como nos montes da paisagem. Mas a professora negou. Disse-me que o rosto de cada um também era imenso como a paisagem e, visto com atenção, tinha distâncias até infinitas que importava percorrer.


Nesse dia, voltei da escola como se tivesse a tampa da cabeça aberta e os pensamentos me fugissem para o vento. (…)
Mas a professora sabia já melhor do que eu e decidiu sentar-me na escola no sentido contrário dos meus colegas. Sentou-me na sua mesa, enquanto ela andava de pé a escrever e apagar coisas no nosso quadro. Fiquei de frente para as sete crianças que estudavam comigo. Sete rostos que, com mais ou menos sono, maior ou menor fome, atacavam os ensinamentos da professora como podiam.

Subitamente, enquanto fazia eu também as minhas letras percebi que uma menina se distraíra a ver nada. Via nada como se fosse alguma coisa. Tinha o rosto parado e apontado para o teto e, embora de olhos abertos, ficava estranha, como se adormecida. O rosto dela, ali todo à flor da pele, pareceu-se realmente com o distante da paisagem. Veio à sua expressão uma lonjura que impossibilitava, a quem a visse, perceber com nitidez o que se passava no seu pensamento.

Percebi que dentro de nós há um longo caminho e muita distância. Não somos feitos do mais imediato que se vê à superfície. Somos feitos daquilo que chega à alma, e a alma tem um tamanho muito diferente do corpo. Percebi que ver verdadeiramente uma pessoa obriga a um esforço como o de estarmos sentados nos nossos bancos a tomar conta do que passa pelos montes.

O rosto é mais turvo que os céus e pode ser muito mais complexo do que saber exatamente de quem é um rebanho e se cresceu ou diminuiu. O rosto começa onde se vê e vai até onde já não há luz nem som. Por isso, por mais que observemos, ainda muita coisa nos há-de escapar e o importante é que estejamos tão atentos quanto possível, para nos conhecermos uns aos outros. Conheci melhor o meu pai.

Conheci melhor a minha mãe. Até conheci melhor o nosso cão, que era mesmo maluco, porque lho via no rosto e tudo. Entendi que o rosto é extenso e infinito, capaz de expressões que vamos conhecendo e outras que nunca vemos. Toda a vida precisamos de estar atentos, senão vamos perder muito do mais importante que acontece em nosso redor. Como se houvesse um incêndio mesmo diante de nós e nem sequer o percebêssemos antes de estar tudo completamente queimado."

O rosto / Valter Hugo Mãe ; il. Isabel Lhano. - 1ª ed. - Carnaxide : Alfaguara, 2010. - 28, [3] p. : il. ; 25 cm. - (Alfaguara infantil). - ISBN 978-989-672-043-8

quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

O livro do mês

 

"Nunca nenhum de nós se tinha encontrado numa situação tão perigosa como a da noite passada. Deus protegeu-nos. Imagina a Policia a remexer na estante da nossa porta giratória, iluminada pela luz acesa, sem dar connosco! Em caso de invasão, com bombardeamentos e tudo, cada um de nós pode responder por si próprio. Neste caso, porém, não se tratava só de nós, mas também dos nossos bondosos protectores.

Estamos salvos. Não nos abandones! É apenas isto que podemos suplicar.Este acontecimento trouxe consigo algumas modificações. O sr. Dussel já não trabalha à noite no escritório do Kraler mas sim no quarto de banho. Às oito e meia e às nove e meia o Peter faz a ronda pela casa. Já não pode abrir a janela durante a noite. Depois das nove e meia não podemos utilizar o autoclismo do W.C. Hoje à noite vem um carpinteiro reforçar as portas do armazém. Há discussões a tal respeito, há quem pense que não se devia mandar fazer isso.

O Kraler censurou a nossa imprudência e também o Henk disse que não devíamos em tais casos descer ao andar de baixo. Fizeram-nos ver bem que somos «mergulhados», judeus enclausurados, presos num sitio, sem direitos, mas carregados de milhares de deveres. Nós, judeus, não devemos deixar-nos arrastar pelos sentimentos, temos de ser corajosos e fortes e aceitar o nosso destino sem queixas, temos de cumprir tudo quanto possível e ter confiança em Deus. Há-de chegar o dia em que esta guerra medonha acabará, há-de chegar o dia em que também nós voltaremos a ser gente como os outros e não apenas judeus.

Quem foi que nos impôs este destino? quem decidiu excluir deste modo os judeus do convívio dos outros povos? quem nos fez sofrer tanto até agora? Foi Deus que nos trouxe o sofrimento e será Deus que nos libertará Se apesar de tudo isto que suportamos, ainda sobreviverem judeus, estes servirão a todos os condenados como exemplo. Quem sabe, talvez venha ainda o dia em que o Mundo se aperceba do bem através da nossa fé, e talvez seja por isso que temos de sofrer tanto. Nunca poderemos ser só holandeses, ingleses ou súbditos de qualquer outro pais. Seremos sempre, além disso, judeus. E queremos sê-lo.

Não percamos a coragem. Temos de ter consciência da nossa missão. Não nos queixemos, que o dia da nossa salvação há-de chegar. Nunca Deus abandonou o nosso povo. Através de todos os séculos os judeus sobreviveram. Através de todos os séculos houve sempre judeus a sofrer, mas através de todos os séculos se mantiveram fortes. Os fracos desaparecem mas os fortes sobrevivem e não morrerão!

Naquela noite pensei que ia morrer. Esperava pela Policia, estava preparada como os soldados no campo de batalha, prestes a sacrificar-me pela pátria. Agora que estou salva, o meu desejo é naturalizar-me holandesa depois da guerra. E Gosto dos holandeses, gosto desta terra e da sua língua. É aqui que gostava de trabalhar. E se for preciso escrever à própria rainha, não hei-de desistir enquanto não conseguir este meu fim.

Sinto-me cada vez mais independente dos meus pais. Embora seja muito nova ainda, sei, no entanto, que tenho mais coragem de viver e um sentido de justiça mais apurado, mais seguro do que a mãe. Sei o que quero, tenho uma finalidade, uma opinião, tenho fé e amor. Deixem-me ser eu mesma e estarei satisfeita. Tenho consciência de ser mulher, uma mulher com força interior e com muita coragem.

Se Deus me deixar viver, hei-de ir mais longe de que a mãe. Não quero ficar insignificante. quero conquistar o meu lugar no Mundo e trabalhar para a Humanidade.

O que sei é que a coragem e a alegria são os factores mais importantes na vida!"

(Excertos do diário de Anne Frank, um dos muitos testemunhos sobre a representação no quotidiano do Holocausto e da ameaça aos judeus).