(É um texto muito conhecido e divulgado e faz eco de uma sabedoria selvagem, a que nós civilizados não conhecemos. Há já vários séculos houve quem soube compreender que a Terra é um berço de vida, onde é necessário respeitar a memória e o património, sinónimos de um desenvolvimento humano equilibrado. Aqui fica um excerto dessa sabedoria que nós, modernos, não sabemos entender.)
«É possível comprar ou vender o céu e o calor da terra? Tal ideia é estranha para nós. Se não possuímos a frescura do ar e o brilho da água, como podem comprá-los? Cada pedaço desta terra é sagrado para o meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada areia da praia, cada bruma nas densas florestas, cada clareira e cada insecto a zumbir são sagrados na memória do meu povo. (...)
Deste modo, quando o Grande Chefe manda dizer que quer comprar a nossa terra, ele pede muito de nós. (...) Assim, consideraremos sua oferta de comprar a nossa terra. Mas não será fácil, pois esta terra é sagrada para nós. Esta água brilhante, que corre nos riachos e rios, não é somente água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada e devem ensinar às vossas crianças que ela é sagrada, e que cada reflexo do espírito, na cristalina água dos lagos, revela acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz dos meus ancestrais.
Os rios são nossos irmãos, eles saciam a nossa sede. Os rios transportam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos a nossa terra, vocês devem lembrar-se e ensinar às vossas crianças que os rios são nossos irmãos, e vossos também, e que devem, daqui em diante, dar aos rios a bondade que dariam a qualquer irmão. (...) A terra [para o homem braco] não é sua irmã, mas sua inimiga, e quando ele a conquista, continua simplesmente seu caminho. Deixa para trás os túmulos de seus pais. E não se importa. Rouba a terra de seus filhos. E não se importa. As sepulturas de seus pais e os direitos de seus filhos são esquecidos. Trata sua mãe, sua terra, seu irmão, como coisas para serem compradas, saqueadas, vendidas como carneiros ou contas coloridas. Seu apetite devorará a terra e deixará somente um deserto.
Não há lugar calmo nas cidades do homem branco. Nenhum lugar para escutar o desabrochar das folhas na primavera ou o bater das asas de um insecto. Mas talvez seja porque sou um selvagem e não compreenda. O ruído parece apenas insultar os ouvidos. E o que resta da vida, se o homem não pode escutar o choro solitário de um pássaro? (...) Onde está o arvoredo? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu. (...) É o fim da vida e o começo de uma sub-vida. (...)
Guardem, na memória das suas almas, como era esta terra quando vocês se apossaram dela. E com todas as vossas forças, com todas as vossas almas, com todos os vossos corações, preservem esta terra para as vossas crianças, e a amem como Deus ama a todos, uma coisa nós sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus. Esta terra é preciosa para ele. Mesmo o homem branco não pode estar isento do destino comum. Apesar de tudo, podemos ser irmãos. Veremos.»
Excerto do Chefe Seattle (1885), in Por Fim Talvez Sejamos Irmãos
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