quarta-feira, 22 de abril de 2020

Minutos de leitura (III)

"Era uma vez, em tempos muito antigos, no arquipélago do Japão, uma árvore enorme, que crescia numa ilha muito pequenina. Os japoneses têm um grande amor e um grande respeito pela Natureza e tratam todas as árvores, flores, arbustos e musgos com o maior cuidado e com um constante carinho.

Assim, o povo dessa ilha sentia-se tão feliz e orgulhoso por possuir uma árvore tão grande e tão bela. Em nenhuma outra ilha do Japão, nem nas maiores, existia outra árvore tão grande. Até os viajantes que por ali passavam diziam que mesmo na Coreia e na China nunca tinham visto uma árvore tão alta, com a copa tão frondosa e bem formada.

E, nas tardes de verão, as pessoas vinham sentar-se debaixo da larga sombra e admiravam a grossura rugosa e bela  do tronco, maravilhavam-se com a leve frescura da sombra, o suspirar da brisa entre as folhas entre a perfumadas.

Assim foi durante várias gerações.

Mas com o passar do tempo surgiu um problema terrível, e por mais que todos meditassem e discutissem ninguém era capaz de arranjar uma boa solução.

Porque, ao longo dos anos, a árvore tinha crescido tanto,os seus ramos tinham-se tornado tão compridos, a sua folhagem tão espessa e a sua copa tão larga que, durante o dia, metade da ilha ficava sempre à sombra.
De maneira que metade das casas, das ruas, das hortas e dos jardins nunca apanhava sol.

E, na metade ensombrada, as casas estavam a ficar húmidas, as ruas tinham-se tornado tristes, as hortas já não davam legumes, os jardins já não davam flor. E a gente que ali morava andava sempre pálida e constipada.

E, à medida que a sombra da árvore crescia, crescia também a perturbação. As pessoas gemiam:
- Que havemos de fazer?

Até que foi decidido a população reunir-se toda em conselho para examinar bem o problema e decidir o remédio que lhe devia dar.
Discutiram durante muitos dias, e depois de todos terem falado chegou-se à triste conclusão de que era preciso cortar a árvore. Houve choros, lamentações, gemidos.

A árvore era bela, antiga e venerável. Fazê-la desaparecer era um ato que não só entristecia os habitantes da ilha mas que também os assustava. Mas não havia outro remédio e quase todos acabaram por concordar com o corte.

No lugar onde antes ela se erguia plantaram um pequeno bosque de cerejeiras, pois as cerejeiras nunca crescem muito."

A árvore / Sophia de Mello Breyner Andresen
Imagem: cedro japonês

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