Os índios da Patagónia mantiveram uma longa relação com a quila e
não só pela bondade da sua utilização como igualmente pelas suas virtudes de
trágico e infalível oráculo. Sempre que floresceu a quila advieram tempos de
dor e desolação. A sua flor é de uma intensa e premonitória cor vermelha, e os
Tehuelches calculavam a sua idade consoante o número de vezes que a tinham
visto florescer. Os que foram testemunhos daquele portenho mais de duas vezes
tinham certamente muito que contar ao calor das fogueiras.
Hoje restam poucos Tehuelches e Mapuches na
Patagónia. São sobreviventes que, agarrados à sua dignidade, decidiram não ser
maisum simpático pormenor étnico para diversão dos turistas, e vivem e excercem
uma espantosa cultura de resistência e de memória de ambos os alados da
cordilheira dos Andes.
As restantes etnias sucumbiram perante as regras de um
processo cujos frutos ninguém é capaz de definir, e delas mal persistem as
recordações ou testemunhos reunidos por alguns estudiosos que realizam o seu
trabalho vigiados pelos preconceitos e a suspeita. É muito difícil escrever a
história dos vencidos, mas a quila continua lá, crescendo nos desfiladeiros,
unida pelos invernos ao errante destino dos gaúchos pobres.
Quando o mês de março encurta os dias, as
abetardas cruzam o céu fugindo aos rigores invernais e o vento amontoa as
nuvens nos vales, então os gaúchos reúnem os rebanhos de reses e empreendem a
subida em direcção à cordilheira, para a estação do inverno. Não são muitos os
bovinos nessa terra débil onde primeiro pastaram os guanacos e que mais tarde
foi pisada por milhões de ovelhas na época dourada da lã.
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