terça-feira, 3 de março de 2020

Leituras na Biblioteca (X)


Era uma vez uma menina com cabelos caídos até aos ombros.
Chamava-se Matilde. Olhava para tudo como se fosse sempre a primeira vez.

Matilde vivia numa quinta dos avós. Aí havia um grande jardim de rosas vermelhas e violetas rasteiras. A porta da entrada era decorada por uma frondosa trepadeira de flores que ora pareciam azuis ora roxas. Matilde chamava-lhe Buga. 

Nas noites quentes, quando o cheiro da trepadeira inundava o jardim, Matilde e a amiga dela que, quando o seu gato dourado morreu, quis que ele ficasse sepultado junto às suas raízes. Desta forma, o gato durado continuaria ali com ela e com o  Pastor, os seu cão branco, de olhos castanhos e doces, que todos os dias ia para lá  ladrar e fazer buraquinhos na terra, como que a chamar o companheiro de antigas brincadeiras. Às vezes, o Pastor levava-lhe ossos.
Mas, como os gatos não gostam de ossos, era ele que os comia.

No jardim havia ainda espaço para algumas árvores de fruto: laranjeiras, macieiras, cerejeiras e oliveiras com folhas cor de prata. Matilde gostava especialmente de uma das laranjeiras. Devido ao amor que sentia por ela, ficou com a alcunha de Laranjinha. Essa árvore tinha um tronco forte onde, bem no meio, havia uma covinha que parecia um banco. 

Matilde sentava-se aí a ler poemas em voz alta para a laranjeira, para os pássaros e para as formigas que ali passavam em carreirinho. Ela gostava de ouvir o som das palavras, para as saborear com todos os sentidos. Procurava a música própria de cada uma e a seguir desenhava-as cuidadosamente, letra por letra. No fim, surgiram palavras de todos os tamanhos, cores e feitios.

Matilde Rosa Araújo: um olhar de menina / texto Adélia Carvalho ; il. Marta Madureira. - 2ª ed., rev. - Porto : Tcharan, 2017. 

Sem comentários:

Enviar um comentário