quinta-feira, 8 de julho de 2021

Biografia (VI) - Duarte Pacheco Pereira

 1. Duarte Pacheco Pereira (1460-1533)

           Com um perfil multifacetado, Duarte Pacheco Pereira destacou-se como cosmógrafo, navegador e heroico guerreiro, durante os reinados de D. João II, D. Manuel I e D. João III. Foi cognominado pelos clássicos como o “Aquiles Lusitano”.

     Duarte Pacheco Pereira nasceu em Lisboa, em 1460, e era filho de João Fernandes Pacheco e de Isabel Pereira. Curiosamente, nasceu no ano em que faleceu o infante D. Henrique. 

    O seu pai, João Pacheco, fez parte de uma expedição contra os turcos no Mediterrâneo Oriental, vindo a morrer em combate na praça de Tânger. Por seu turno, o seu avô, Gonçalo Pacheco, foi tesoureiro da Casa de Ceuta. Duarte Pacheco Pereira era ainda descendente de Diogo Lopes Pacheco, um dos homens que participou na execução de D. Inês de Castro.

1. Adolescência e juventude

Filho de um hábil navegador e neto de um armador, cresceu sempre em contacto próximo com o mar e com histórias das destemidas viagens dos portugueses e das novas terras que iam descobrindo ao desbravar sem medo o oceano.

Essas histórias fizeram com que começasse, desde cedo, a demonstrar um espírito irreverente, com desejo pela aventura e pela conquista de grandes feitos. Ao serviço da pátria desde a sua juventude, com os mais diversos feitos, tornou -se, aos poucos, um dos portugueses mais notáveis naquela época.

3. Principais feitos

  Entre 1480 e 1490, participou em viagens de exploração e reconhecimento do litoral ocidental africano. Em 1488, encontrando-se doente na ilha de São Tomé, foi trazido de volta para o reino por Bartolomeu Dias.

De Janeiro a Outubro de 1490, integrou a guarda pessoal d’el-Rei D. João II.

Mais tarde, em 1494, fez parte da delegação portuguesa que negociou e assinou o Tratado de Tordesilhas em 7 de Junho desse ano, sendo escolhido por D. João II para esta delegação na qualidade de cosmógrafo de excelência. Estudos mais recentes demonstram que, dispondo de meios limitados nessa época, terá conseguido calcular o valor do grau de meridiano com uma margem de erro de apenas 4%.

Entre 1495 e 1499, integrou a missão no Castelo de São Jorge da Mina.

 Em 1500 acompanhou Pedro Álvares Cabral na sua viagem pelo Oceano Atlântico, que culminou com a descoberta oficial do Brasil.

Participou em várias outras viagens, nomeadamente, à Índia, para onde partiu no dia 6 de Abril de 1503, na armada de Afonso de Albuquerque, ao comando da nau Espírito Santo, e teve um papel de destaque na defesa da cidade de Cochim perante a investida da cidade vizinha de Calecute. Regressou a Lisboa em 1505, sendo recebido por todos com grande entusiasmo e aclamado como uma espécie de herói internacional. Nesse ano iniciou a redação da sua obra literária e roteiro náutico “Esmeraldo de Situ Orbis”.

Mais tarde, voltou a S. Jorge da Mina, cidade da qual foi governador e capitão entre 1519 e 1522. No final desse período retornou a Lisboa.

4. Velhice 

Apesar de todos os seus grandes feitos e do papel de destaque que sempre ocupou junto das Cortes de D. João II, D. Manuel I e D. João III, Duarte Pacheco Pereira acabou os seus dias na miséria e assolado por vários desgostos, como a maioria dos grandes homens portugueses

5. Morte e legado

Duarte Pacheco Pereira faleceu no início do ano de 1533 e o seu legado é bastante diversificado.

Doc. 1 * A experiência, mãe de todas as coisas

                “Nunca os nossos antepassados […] imaginaram que viria o tempo em que o Ocidente conheceria o Oriente como agora conhece. Os escritores antigos escreveram sobre isso tantas fábulas que se pensava ser impossível navegar até ao Oriente. Ptolomeu escreveu sobre o Índico como sendo uma lagoa fechada, sendo impossível lá chegar por mar.

                Outros disseram […] que nele havia muitas sereias e animais nocivos, pelo que esta navegação se não podia fazer […].

Como a experiência é a mãe de todas as coisas, por ela soubemos radicalmente a verdade.”

Duarte Pacheco Pereira, Esmeraldo de Situ Orbis 


A sua obra “Esmeraldo de Situ Orbis” - iniciada em 1505 após o seu regresso a Lisboa e que foi interrompida no ano de 1508, ficando assim incompleta, e que apenas foi descoberta a partir do séc. XIX - apresenta-se como uma das mais importantes obras literárias representativas da escola náutica portuguesa. Esta obra, conhecida na época como um regimento náutico, ao mesmo tempo que contesta o saber livresco tradicionalmente aceite, destaca o papel da experiência como fonte do conhecimento (doc. 1) e veio revelar uma outra faceta de Duarte Pacheco Pereira, constituindo um autêntico roteiro pela costa ocidental e oriental de África. Nela, o autor apresenta constantes comentários e dá várias indicações de que durante uma das suas viagens, em 1498, teria sido incumbido de descobrir “uma tão grande terra firme” a ocidente do Oceano Atlântico, partindo do arquipélago de Cabo Verde. Nesta obra incompleta destaca-se então o papel ativo de Duarte Pacheco Pereira como roteirista.

Surgem neste contexto várias especulações de que poderia efetivamente ter alcançado a costa brasileira durante essa expedição, partindo propositadamente e de forma secreta em direção a Oeste desde o arquipélago de Cabo Verde. A ser verdade e porque a zona onde chegou, estaria localizada no domínio de influência de Castela, o feito não foi divulgado publicamente, evitando assim confrontos com a coroa castelhana.

O tratado de Tordesilhas foi considerado o tratado mais importante do séc. XV e todo o saber científico de Duarte Pacheco Pereira revelou-se um elemento fundamental na defesa dos interesses dos portugueses.

Doc. 2 *

                “ […] e por não alargar mais a matéria, leixo de dizer as particularidades de muitas cousas que este glorioso Príncipe mandou descobrir por mim e por outros seus capitães em muitos lugares e rios da costa da Guiné, dos quais, em tempo do Infante Dom Anrique e del-Rei Dom Afonso, a costa do mar somente era sabida sem saber o que dentro nelas era; […]”

Duarte Pacheco Pereira, in Prólogo de Esmeraldo de Situ Orbis


Esta informação do prólogo (doc. 2) confirma o seu envolvimento nas explorações africanas, durante o reinado de D. João II, e os passos decisivos para um conhecimento mais profundo da África Ocidental e dos seus povos, uma etapa fundamental para alcançar, mais tarde, o tão desejado mercado de especiarias no continente asiático. De realçar que, com a descoberta oficial do Brasil, efetuada pela armada de Pedro Álvares Cabral, em 1500, não foram valorizadas publicamente as navegações realizadas anteriormente por este hábil e destemido navegador.

Miguel Gonçalves - 5..º FA

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