«Liberdade. Passei a vida a cantá-la, mas
sempre com a identidade no pensamento, ciente de que é ela o supremo bem do
homem. Nunca podemos ser plenamente livres, mas podemos em todas as
circunstâncias ser inteiramente idênticos. Só que, se o preço da liberdade é
pesado, o da identidade dobra. A primeira, pode nos ser outorgada até por
decreto; a outra, é sempre da nossa inteira responsabilidade.»
O autor do mês de Janeiro na Biblioteca é Miguel Torga. Na verdade é mais do que um autor, é uma geografia e uma paisagem humana únicas. Na primeira entrada para a sua apresentação importa salientar que Torga foi um ser de grande valor humano feito de uma raridade e de uma frontalidade só quase vivida pela geografia mais sublime. Mais que um homem, foi uma criação de um património, a respiração do vento mais puro, agreste, difícil, verdadeiro e frontal como as quedas de água no alto das fragas.
Miguel Torga, pseudónimo do médico Adolfo
Coelho da Rocha que mistura a reverência por Unamuno e Cervantes na escolha de
Miguel e de celebração do mais agreste, as pequenas flores silvestres no cimo
dos montes. Torga representa na dimensão humana o carácter duro, mas solidário,
frontal, mas apaixonado por uma consciência de valores imutáveis.
A sua escrita apresenta o encanto silvestre e a
originalidade humana desse reino único, muito especial, aquele deu o nome de
maravilhoso.
A sua obra literária e a sua figura humana são a morada desse tempo quase
eterno onde a montanha faz nascer a liberdade e a beleza. Torga confunde-se com
esse reino. Há nele essa dimensão de natureza frontal, em estado maciço que se apresenta
como um universo a descobrir, uma fonte de vida e valores universais. Um
universo de pura pedra inconformável com a injustiça, incapaz de metamorfoses
sob o peso dos outros, ou do mundo.
Miguel Torga é na verdade uma atmosfera de
resistência e de revelação. O seu desencanto nos últimos anos de vida revelou
uma vez mais que ele era de um outro tempo. Durante o mês, a ele voltaremos
para divulgarmos uma obra única que nos faz compreender como somos herdeiros de
um território e de uma identidade. A sua atualidade é por demais evidente, num
tempo a esquecer-se do essencial em relação ao património, como identidade de
pessoas e de um território.
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