Agustina Bessa-Luís e Eugénio de Andrade celebram este ano o centenário do seu nascimento. A semana da leitura organiza um conjunto de atividades à volta da sua obra e via literárias. Esposende foi um local geográfico e humano onde os dois escritores passaram momentos da sua vida. Agustina viveu nos anos sessenta quatro em Esposende e Eugénio frequentou diversas vezes os espaços da costa, entre Esposende, Apúlia e Fão.
Eugénio
«Troco este céu impassível pelas dunas de Fão, agora só na memória.
Também aí as gaivotas anunciavam que a luz mudara de direcção, e algumas aproximavam-se tanto do meu rosto que eu chegava a recear que me bicassem os olhos. Elas vêm e vão, o céu está agora mais claro, já não as vejo. Talvez não caia mais que um dedinho de água, ou nem isso sequer.”
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Quando, há muitos anos, o Eduardo, o Ernesto e eu deixámos as bicicletas no posto da Guarda-Fiscal e, passadas duas ou três barracas onde os lavradores da Fonte Boa arrecadavam o sargaço, entrámos, ainda manhã cedo, pelas dunas desertas, e os pés já sem sandálias corriam na alegria da brisa ligeira, senti que pisava pela primeira vez a terra prometida. Durante alguns anos, a minha pátria foram estas dunas, o mar dos meus primeiros poemas foi este mar, e a eternidade, que Shakespeare diz ter morada nos lábios de António e Cleópatra,
Brincava comigo naquelas areias, corria à solta naquelas vagas (…)
Nenhum Tamariz, nenhuma Granja levava ao deserto, e era exactamente ao deserto que levavam as dunas de Fão. Ali o espaço não fora ainda ferido; era por assim dizer um espaço sagrado, como todo o lugar onde nos sentimos inteiros.”
Eugénio de Andrade
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