quinta-feira, 7 de outubro de 2021

Um filme - Ben - Hur (I)

 

Ben-Hur é a primeira proposta de cinema para este mês, em visualização na Biblioteca. O visionamento de cada filme será acompanhado por um guião, designado de bibliocine e que será incorporado num ficheiro a incorporar on-line. Tal como na poesia e na arte visual, nos documentos / trabalhos realizados nesta área formarão um conjunto de recursos cinematográficos que darão corpo ao espaço do projeto do plano nacional das artes.

Ben-Hur é um filme marcante por muitos aspetos. Pela história, pela dimensão da epopeia retratada, pela produção cinematográfica que fez de Hollywwod e de alguns dos seus estúdios fazedores de um tipo de cinema histórico que deixou de se realizar nas décadas seguintes.

Ben-Hur é a história de uma família de judeus na Palestina, da representação de um modo de vida mercantil, dos hábitos culturais e religiosos num espaço conquistado pelo Império Romano. O filme é a história de uma amizade, de Ben-Hur e de Messala e de como as origens diversas se imporão quando Roma assume o seu poder civilizacional em todo o império. 

Ben-Hur é um fresco sobre o império romano, o modo de vida, a organização social e política, o exército e a organização administrativa que impunha um modo de ver a vida, de olhar o mundo. É também um imenso retrato sobre o aparecimento da figura de Jesus Cristo e de como novos valores colidiram com a cultura romana. 

História de uma amizade, de uma vingança pela recuperação de uma dignidade perdida, Ben-Hur é um filme extraordinário sobre o valor do indivíduo face ao poder, quando este autocrático. Ben-Hur discute de uma forma muito substantiva como as ideias governam as sociedades, como elas podem alterar valores e princípios dando lugar a profundas alterações no seu funcionamento. A fotografia, a realização, a música tornam-no num épico de qualquer tempo. A sua adequação ao currículo da disciplina de História é muito evidente.

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

Uma obra de arte - Altamira



Uma obra de arte por semana é um outro elemento (a que se junta a o poema e o filme com a mesma periodicidade) que procura ser a partilha de  um recurso educativo que possa ser integrado com outras fontes de trabalho, naquilo que se enquadra no plano nacional das artes. Tenta ser uma leitura intermitente de alguns marcos da memória coletiva e um recurso educativo sobre esta área do conhecimento.

Na história da Arte da Pré-História existiram diferentes marcos. É, no entanto consensual que um dos pontos primeiros mais entusiasmantes é Altamira, pois nela confluem aspetos decisivos do valor mágico dessas representações e da libertação de alguns elementos para algo que não se relacionando diretamente com a sobrevivência tinha com ela uma ligação especial.

A gruta de Altamira, situada no município de Santillana Del Mar, no norte de Espanha é um das primeiras grandes manifestações da arte criadas pelo ser humano. Foi descoberta no final do século XX e reconhecido o seu extraordinário valor no início do século XX.
As pinturas da gruta de Altamira conduzem-nos ao Paleolítico Superior e terão sido feitos há cerca 14 mil anos, antes da era cristã. As primeiras comunidades humanas eram nómadas, pois não sabiam produzir alimentos, vivendo da caça, da pesca e da recoleção. Os grupos humanos vivam em bandos dividindo entre si o espaço e as diferentes tarefas. As grutas, os abrigos nas rochas e as cavernas eram os seus locais de habitação.

Estes grupos humanos dedicaram-se a fazer pinturas de cenas de caça, a que damos o nome de pinturas rupestres, pois eram feitas na rocha. As representações têm uma abordagem muito naturalista, sendo os animais captados no desenho, como os via na Natureza. Durante algum tempo pensou-se que poderia ser esta uma tarefa de registo das suas atividades, porque ligadas à sobrevivência do grupo. É hoje consensual que a principal motivação destas comunidades na construção das pinturas rupestres era criar um ritual mágico. Os desenhos representavam uma forma de apropriação de um significado, a caça e a sobrevivência. 

As pinturas rupestres são uma primeira forma de construção de rituais, em que se procurava antecipar a construção de um poder que permitisse caçar algo, do qual dependiam para sobreviver. Representar o animal era de certo modo conseguir caçá-lo e isso conduz para as primeiras formas de uma religião, como construção de uma ideia sobre o quotidiano. As pinturas rupestres estão ligadas a uma nova forma de vida em comunidade que só foi possível com o domínio do fogo, permitindo cozinhar os alimentos e facilitou a iluminação das grutas e cavernas.

O que fascina em Altamira é a forma como foram aproveitadas as formas e as irregularidades do tecto da gruta, que assim permitiu que os desenhos obtivessem um sentido de profundidade e volume. Os desenhos marcados por bisontes de diferentes tamanhos são representados com muito realismo e com bastante detalhe nos pormenores. Os pigmentos usados revelam-se igualmente de uma tonalidade deslumbrante. De salientar que  estas pinturas eram feitas com os materiais que a Natureza oferecia. a saber, pigmentos extraídos de minerais, carvões, gordura e sangue de animal. As cores mais usadas eram o vermelho, com variações de ocre, negro e amarelo.

Imagem: Copyright -  bisontes na gruta de Altamira, (14.500 a 15.000 anos antes de Cristo), Norte de Espanha.

A palavra e o mundo

 


"Não são as pessoas que fazem as viagens mas sim as viagens que fazem as pessoas." (1)

A diversidade contempla-nos. O mundo é imensamente diverso, variado, diferente e é nele que nos reconhecemos. A  identificação com ele, a nomeação das coisas foi-nos atribuída pelo uso de algo que nos faz reconhecer a nossa própria identidade. A saber, a linguagem. Na formação do mundo, em Génesis é o criador que indica ao primeiro ser que dê nomes às coisas, para que entenda o que elas significam. Há assim uma relação direta entre as palavras que usamos e o mundo que habitamos.

A própria vida é ela uma viagem, no sentido de uma descoberta e da construção de uma relação. A viagem é feita de diversos modos, caminhando, escutando, observando, mas também lendo. O mundo acaba por ser a nossa leitura. Pela leitura descobrem-se janelas, que alargam horizontes, que nos revelam coisas, lugares, emoções que desconhecíamos. A palavra e o mundo é um modo de registar de modo diverso essa leitura com as palavras e com a experiência de cada um.

A identificação do mundo em cada um pela linguagem revela-nos que na viagem vivida, sonhada, pensada, ou decifrada há sempre a procura de uma sabedoria que se revela no reconhecimento do outro. Essa sabedoria é uma forma de iluminar caminhos e de construir afetos. Os livros e as palavras podem ser usados nesses caminhos. a palavra e o mundo é um pouco isso o que procura realizar com a participação das leituras de cada um, das escritas que cada um puder partilhar.

A palavra e o mundo é a designação que escolhemos para a etiqueta que organizará um conjunto de propostas de leitura, exploração de temáticas à volta de uma ideia chave, o livro e a viagem, cada um de nós e o mundo. A viagem dentro do livro, aquela que nos permite transformar um sentido, uma forma de ver o mundo, de nele escrever o que tentamos ser. A viagem como descoberta, entre as suas dimensões físicas e espirituais. Ler, mas também saber compreender o mundo dessas palavras, o que ele revela.

Reconhecer os outros e o seu mundo é ir ao encontro de diversas culturas, de diferentes cores, de ver a vida na sua diversidade. Essa diversidade é construída pela viagem, pois é ela que nos faz ver o traçado mais importante da geografia, é ela que nos faz descobrir os poemas do planeta, em cada recolha de mar, sal e pó. É a viagem que nos organiza, nos identifica e é nela que a variedade do mundo nos recria de originalidade. A linguagem tenta dar corpo a essa originalidade.

Em cada mês as propostas de um livro são ideias para construir a viagem nas suas diferentes dimensões. O projeto Rotas do Oceano integra-se aqui pela diversidade do natural e do património histórico e cultural. Descobrir essa diversidade geográfica com os mares, os oceanos e a utilização humana numa visão histórica e de sustentabilidade. Descobrir também os percursos interiores que as palavras fazem nascer dentro das suas linhas. A viagem também como como forma de aprendizagem, pois é nela que podemos compreender a beleza do planeta, a sua diversidade, o belo entre os momentos de imperfeição de que é composta a vida. 

(1) John Steinbeck, citado do prefácio de Gonçalo Cadilhe, Um lugar dentro de nós. (2012). Lisboa: Clube do Autor. 

Imagem: Copyrighjt - Nas margens do rio Neiva, (Visitesposende.com)

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

O escritor do mês - Manuel António Pina

 

"A beleza é o rosto mais jubiloso da verdade. Não da própria verdade, mas do seu rosto". (1)

Tinha uma paixão pelo Winnie the Pooh. Olhava para a literatura infantil como a possibilidade de reencontrar o olhar inicial, o que está pronto para a linguagem do mundo, ainda sem o conhecer. Revelou uma curiosidade para traçar pela poesia um olhar sobre o real, natural em si, mesmo que dele se desprendessem valores filosóficos inerentes à natureza humana.

Refletiu sobre a sociedade em que viveu com liberdade, com inteligência e com criatividade. Deu-nos no JN um conjunto de crónicas sobre esse real que se sonha e que não se compreende pela ausência de uma real interrogação de figuras e instituições sobre os valores básicos do que os gregos chamaram "Humanitas, Libertas, Felicitas".

Foi um cronista que ousou utilizar as palavras para discutir "as verdades" que o establishent político gosta de enumerar como os pilares do universo, por onde interesses privados se alimentam da destruição mais básica dos valores de dignidade de tantos.

E foi um poeta. Um poeta que nos descreveu como nos orientamos com os mitos, como respiramos o real, entre os lugares e as suas sombras, por onde tentamos reconhecer os gestos. Sempre que vivemos com um poeta, temos o convívio das palavras e desse timbre de voz, onde permanecem a memória e o coração das ideias, emoções, onde o sorriso nos guardará desse "dragão feroz" que é o próprio tempo.

Manuel António Pina é o escritor do mês na biblioteca. Dele destacaremos algumas das suas produções literárias e daremos voz com as suas palavras a algumas iniciativas de leitura. É uma figura que vale muito a pena descobrir. A verdade é que vivemos em corredores pouco iluminados, pois a memória não é um valor muito incentivado. Manuel António Pina foi uma dessas vozes com que ficamos mais "ricos" com o conhecimento das suas palavras e de um modo de ser grandioso e fraterno. 


 (1) Entrevista a António Manuel Pina, in Jornal i, 18/02/21012
(2) Ana Maria Matute, Paraíso Inabitado

quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Cinema e educação


O cinema é ainda visto em larga medida como uma forma de entretenimento e não assume ainda uma regularidade substantiva, a utilização do cinema, como recurso educativo generalizado. A filmografia portuguesa não tem ainda grande expressão como ferramenta de estudo educativo para a construção da compreensão sobre a sociedade. O cinema pode ser uma ferramenta muito interessante para construir abordagens diferenciadas no espaço educativo.

O cinema é um das ferramentas mais interessantes para conhecer a memória, ou excertos dela. Ao convocar imagem, literatura, música no sentido de apresentar uma narrativa que persegue diferentes objetivos, o cinema auxilia-nos a conhecer universos que não foram vividos por nós. O cinema dá-nos fontes de entretenimento, apresenta-nos contextos históricos, recria universos fantásticos e procura discutir princípios e formas de olhar o Mundo. O cinema vive muito da oferta da arte de ficção, entre o narrado como acontecimento e um olhar poético que evidencia formas possíveis de ver o real.

O cinema possui uma linguagem diferente de outras linguagens narrativas, pois dá através da imagem bidimensional uma leitura que procura aproximar-se das dimensões do espaço físico, onde habitamos. Na verdade o cinema sugere-nos pela sua capacidade de reproduzir som e movimento uma quase identificação com uma realidade, ainda que seja uma leitura ou uma impressão daquela. O cinema apresenta-nos uma dupla representação, dos cenários, dos atores e da própria película.

É assim um recurso de grande significado na aprendizagem de quotidianos, de movimentos históricos ou do papel do indivíduo na construção de transformações sociais e culturais. O cinema é um suporte de conhecimento que nos pode levar a compreender processos e geografias culturais, formas marcantes e diversas de olhar o mundo. 

A Biblioteca (EBARS e EBF) terá este ano letivo a apresentação à quinta-feira (planificação a apresentar na próxima semana) de um filme semanalmente. Cada filme será dividido em duas sessões, tendo cada sessão a durante de um tempo letivo e assim em cada mês serão projetados dois filmes. Articulado com as sessões, o blogue da Biblioteca dará um destaque à sua narrativa / imagens marcantes / sinopse. O currículo, o ambiente, a literatura e a história serão os itens com que se tentará articular as escolhas dos filmes. As fitas do mês e os recursos do PNC serão também destacados como recurso educativo que possa ser desenvolvido, no tempo disponível para o mesmo.

Imagem: A Invenção de Hugo Cabret, no que foi uma homenagem a George Méliès. 
Direção de de Martin Scorsese, a partir de um livro de Brian Selznick, 2011.

terça-feira, 28 de setembro de 2021

Da leitura

 

"Os livros são casas
com meninos dentro
e gostam de os ouvir rir,
de os ver sonhar
e de abrir de par em par
as paisagens e as imagens,
para eles, lendo, poderem sonhar."

Ler doce ler / José Jorge Letria. Lisboa: Terramar - 2004
Leituras na Biblioteca - 5.º FA

segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Um poema - Os livros

 

Os livros gostam de olhos de qualquer cor,
de dedos de qualquer cor,
e às vezes gostam de vozes dedicadas
que fazem das palavras seres com vida,
seres que sonham, seres que inventam
e criam alvoroço no teu peito.
Os livros gostam de luz e de paz para serem lidos,
embora muitos livros sejam lidos quase às escuras,
ou com fome
e às vezes até em plena guerra.
Os livros gostam de corações que sentem,
mentes que pensam.
Os livros gostam de tudo isto e de muito mais.
Os livros, creio eu, gostam de mim
e também por isso eu gosto dos livros.

"Os livros", in Coisas que gostam de coisas / João Pedro Mésseder e Rachel Caiano. alfragide: Caminho, 2021.

Imagem: copyright: Jean-Honoré Fragonard, A leitor, c. 1776, National Gallery of Art, Washington.